As Gárgulas do século XIII ao XVI em Portugal
Apresentação: Curso de cinco sessões intitulado As Gárgulas do século XIII ao XVI em Portugal, com coordenação científica da Doutora Patrícia Alho.
Apesar da vulgarização das gárgulas na época medieval, sabemos que o seu aparecimento ocorreu em épocas bem mais distantes: no antigo Egipto as gárgulas eram utilizadas para escoar as águas usadas para lavar os vasos sagrados, na Grécia as águas dos telhados passavam através das bocas dos leões e em Pompeia foram encontradas muitas gárgulas com a forma de animais. “As catedrais do século XIII escrevem em formas monumentais uma espécie de terceiro testamento, feito pela união íntima da Bíblia Judaica e da Bíblia Cristã”.
Iremos neste curso analisar iconograficamente as gárgulas presentes em alguns dos edifícios para além da função primordial das gárgulas de desaguar as águas pluviais para o exterior da zona coberta, outras das funções com elevado interesse é a função pedagógica presente nas mesmas, tal como é reconhecido por Catarina Fernandes Barreira: “Este panorama responde à principal função das gárgulas, depis da utilitária: a função pedagógica”.
Este é um tema que pouco se tem trabalhado em Portugal, mas internacionalmente tem vindo desde as últimas décadas a ter especial atenção pelos investigadores da arte medieval. Assim sendo iremos fazer uma ligação ao restauro efectuado nos edifícios e à originalidade de algumas das gárgulas presentes nos edifícios.
É importante a salientar a diferença entre os termos gárgulas, quimeras e goteiras que temos vindo a utilizar ao longo deste trabalho, pois o seu significado é para nós diferente e importante de realçar, enquanto o termo gárgula se refere à escultura com a função hidráulica e simbólica, o termo quimera é unicamente uma escultura com a função simbólica e finalmente o termo goteira diz respeito ao objecto arquitectónico que tem a função de depositar as águas para fora do edifício, tratando-se do final do subsistema hidráulico superior.
A decoração das gárgulas pode ser de cariz religioso ou profano. No que diz respeito à arte profana, Paulo Pereira defende que esta exprime, maioritariamente, uma visão carnavalesca do mundo e do mundo ao contrário, usando temas provocadores, como por exemplo os obscenos. Por vezes, são também emergências de figurações relacionadas com a sobrevivência de cultos, rituais de origem pagã, ou da religião não dominante, figurando símbolos esotéricos.
Quanto à arte popular, o autor afirma que uma das características da escultura ornamental medieval é a penetração de discursos “alternativos” ou mesmo “marginais” em programas canónicos e “oficiais” dos monumentos. Defende ainda que é nos pormenores quase invisíveis a olho nu que as representações se observam, como por exemplo nas gárgulas. Podemos constatar que a grande maioria das gárgulas femininas se encontram desnudas e a representação de gárgulas masculinas tem por vezes o pormenor de estar a segurar no sexo.
É interessante notar que as representações fantasiosas e até exóticas que encontramos nos elementos esculpidos são, no entender de Reáu, sinais de influências orientais, que se reflectem no gosto pelas representações fantásticas ou monstruosas, popularizadas pelos bestiários.
Os temas iconográficos evoluíram consoante o tempo e o local em que eram representados. Muitas são as vezes em que encontramos o cunho dos escultores nas gárgulas, rosáceas e frestas, pois nestes “pormenores” decorativos os artistas costumavam ter mais “liberdade de manobra” para poderem deixar na pedra o seu vestígio e imaginação artística, como podemos ver no mosteiro de Santa Maria de Belém, na catedral da Guarda e no Mosteiro de Santa Maria da Vitória. Tudo isto leva a que, a leitura das peças tenha de ser feita com uma maior atenção, pois poderá ter sido acrescentado algum simbolismo que não estava previsto no plano inicial. Desta forma, estes “pormenores” da lavra do edifício ficaram abandonados ao arbítrio, predilecção ou tradição dos artistas/escultores.
Conteúdos programáticos (Fevereiro):
I. As Gargulas Batalhinas e a sua repercussão: Mosteiro de Santa Maria da Vitória (Batalha), Catedral da Guarda e Igreja de Nossa Senhora do Pópulo (Caldas da Rainha), Mosteiro de Santa Cruz (Claustro da Manga, Coimbra).
II. As Gárgulas no Mosteiro de Santa Maria de Belém
III. As Gárgulas Alentejanas: Catedral de Elvas, Catedral de Évora e Convento de Nossa Senhora da Conceição (Beja)
IV. Gargulas ao Sul (Algarve): Catedral de Faro, Catedral de Tavira
V. As Ilhas e as Gárgulas (Arquipelago da Madeira e Arquipelago dos Açores)